Cerveja no Brasil foi, durante muito tempo, vendida para homens, entre 18 e 34 anos, que n\u00e3o viam problemas na objetifica\u00e7\u00e3o da mulher. O p\u00fablico foi exposto por anos a campanhas\u00a0antigas de TV e impresso nos anos 2000 as quais n\u00e3o deixam espa\u00e7o para outras interpreta\u00e7\u00f5es. Modelo loura com corpo de viol\u00e3o posa com um copo de cerveja gelada na m\u00e3o. Um duo “cerveja\/loura infantil”.<\/p>\n

Calhou que eu, Bianca, aos 20 e poucos anos, senti pela primeira vez o brilho nos olhos ao considerar construir uma marca de cerveja com a minha fam\u00edlia, que durante mais de tr\u00eas d\u00e9cadas se especializou em restaurantes, nos quais eu trabalhei desde os anos em que minhas amigas estavam assistindo o Disney Channel.<\/p>\n

Junto ao idealizador e familiares, a experi\u00eancia nos restaurantes me ajudou a montar a equipe da cervejaria Noi, em 2010. Somos tr\u00eas mulheres, jovens, realizando a gest\u00e3o e conselho administrativo. Somos minha irm\u00e3, minha prima e eu. S\u00f3 nos demos conta de refletir sobre o preconceito quando come\u00e7amos a ser abordadas por mulheres que trabalham em mercados, como o nosso, “masculinos”. Elas pediam para que n\u00f3s compartilh\u00e1ssemos nossas experi\u00eancias de vida. Talvez por terem passado por casos de ass\u00e9dio f\u00edsico ou moral.<\/p>\n

Acho que a disciplina da pr\u00e1tica do t\u00eanis, ensinada por meu pai, idealizador da Noi, foi instrumental para navegar esse dia a dia.\u00a0 Muito rigoroso, ele estimulava a minha pr\u00e1tica ao esporte e a competitividade no t\u00eanis. Os elogios n\u00e3o vinham f\u00e1cil. Parei de focar na resposta paterna e passei a me concentrar na minha performance para alcan\u00e7ar os resultados.<\/p>\n

Depois de um tempo parei de pensar em mim mesma como a filha do meu pai que toma conta dos neg\u00f3cios. Eu amo o que eu fa\u00e7o, mas sim, j\u00e1 passamos por desrespeitos impublic\u00e1veis, comparados aos dos moleques de col\u00e9gio.\u00a0 Existe a ignor\u00e2ncia dos bobos que querem nos tratar ou como uma crian\u00e7a ou uma mulher jovem que \u00e9 atraente demais para trabalhar neste meio. E quando eu digo que o preconceito existe, eu o vejo partindo de todos os lados. Vejo-o entranhado em muitas mulheres tamb\u00e9m. Mulheres que transpiram o preconceito atrav\u00e9s das suas atitudes profissionais e pessoais.<\/p>\n

Trabalhar em fam\u00edlia e ser jovem no mundo corporativo s\u00e3o desafios, mas o de ser mulher em um mercado de trabalho masculino representa algo que automaticamente me coloca em um papel. Desconstruir a percep\u00e7\u00e3o exposta por anos do feminino com a cerveja \u00e9 um grande desafio, mas se meu foco \u00e9 gerar resultados, n\u00e3o permito que isso represente uma barreira com a qual eu me lastime todos os dias, mas algo que eu deva ter consci\u00eancia da exist\u00eancia e continuar aprendendo a encarar com profissionalismo. Lidar com o preconceito faz parte do jogo, ele \u00e9 real, mas ele n\u00e3o ocupa a posi\u00e7\u00e3o do meu objetivo. Se combater isso faz parte, desconstruir para construir \u00e9 o meu esfor\u00e7o e o meu papel.<\/p>\n

Construir em cima de fatos uma perspectiva positiva \u00e9 o meu dever. Um exemplo \u00e9 a cerveja que leva o meu nome, Bianca. Nossa fam\u00edlia construiu um legado, e se somos parte dela, uma homenagem aos familiares nomeando os produtos faz sentido, s\u00e3o nossos valores incorporados aos produtos de qualidade que vendemos. Quest\u00e3o de l\u00f3gica, e quando transmitimos para o cliente ele fica encantado. Estimular o questionamento e a auto reflex\u00e3o, em mim e nos outros, atrav\u00e9s de fatos, e perceber o impacto que isso gera \u00e9 a maior recompensa que se pode ter deste desafio. Diante dos preconceitos ainda existentes, garanto que vou continuar usando salto, batom e evoluir ainda mais com a nossa marca de cerveja. Mais um legado nosso para a sociedade.<\/p>\n

 <\/p>\n

Bianca Buzin<\/p>\n

S\u00f3cia Diretora da Cervejaria NOI<\/p>\n

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